Sul: Episódio #10
O recolher obrigatório inverteu-se e o programa Nacional 2 - Mais que uma estrada impele-nos a sair de casa. Temos vindo a descobrir verdadeiros achados históricos, culturais, grastronómicos e paisagísticos. Multiplicam-se os cenários ideais para passeios a pé, de bicicleta, a cavalo, de barco ou de balão. E as aventuras dedobram-se. Em pleno Sul de Portugal, aguardam-nos algumas das localidades mais autênticas do interior alentejano. Estamos de partida para mais um episódio que promete surpreender a cada etapa do itinerário: Montemor-o-Novo, Alcáçovas, Viana do Alentejo e Torrão.
Publicado em 28 de Setembro de 2022 em 09:00 | Por Cofina Boost Content
"Caminhos por aqui há muitos e todos vão a Montemor", escreveu José Saramago.
Olímpio Galvão, presidente da Câmara de Montemor-o-Novo, aguçou-nos o apetite para descobrir aquele que é “o sétimo maior concelho do País e tem 45 quilómetros da Nacional 2, desde o Ciborro com o seu marco 500 e uma excelente gastronomia, passando pela cidade de Montemor-o-Novo, com um património natural, cultural e histórico riquíssimo, até à vila de Santiago do Escoural, onde temos a Gruta do Escoural, com arte rupestre e onde viveram os primeiros habitantes do concelho há cerca de 50.000 anos”.
Nesta terra humildemente gigante, o passado glorioso convive com o presente dinâmico, em parte ditado pela intensa vida cultural. Ao longo do ano, há incontáveis atividades no âmbito da música, desporto, gastronomia, teatro, dança, etnografia, e muito mais.
Começamos pelo ex-líbris da cidade, o Castelo Medieval, com tanta história para contar: foi no Paço do Alcaide que Vasco da Gama finalizou os planos para o caminho marítimo para a Índia. Este mesmo castelo, resistiu à Guerra da Restauração contra Castela, às invasões napoleónicas e foi o quartel-general das tropas liberais sob o comando do marechal duque de Saldanha, na Guerra Civil Portuguesa.
A imaginação divaga enquanto entramos no castelo pela Porta da Vila, apreciamos o brasão manuelino da Casa da Guarda e subimos à Torre do Relógio. Ainda nas muralhas, passamos pelo Convento da Saudação, de grande valor artístico, e pela Igreja de São Tiago, que hoje alberga o Centro Interpretativo do Castelo, onde se pode conhecer a história e a evolução desta povoação.
Depois desta autêntica viagem no tempo por entre as ruínas do castelo, decidimos visitar o Convento de São Francisco, classificado como Imóvel de Interesse Público desde 2010, e o Santuário de Nossa Senhora da Visitação, uma ermida do século XVI em estilo manuelino-mourisco, com painéis de azulejos do século XVIII alusivos à vida de Maria e uma coleção composta por mais de 200 ex-votos, retábulos, fotografias e até animais embalsamados.
Lá em baixo, nas ruas da cidade, é fazer uma “caça ao tesouro” pelo maravilhoso património que a cidade tem para oferecer, como a magnífica Igreja Matriz, que no passado pertencia ao Convento de S. João de Deus (santo padroeiro dos doentes nascido nesta cidade), o portal manuelino da Igreja da Misericórdia, a sacristia e a pintura da Igreja do Calvário ou o Chafariz do Besugo.
E se o telemóvel, grande companheiro de viagem, tiver algum problema? Só precisa de contactar o iServices e solicitar uma recolha gratuita do equipamento. A rapidez da reparação é garantida, para que possa contar com o seu copiloto durante o resto da rota.
O jardim público e as piscinas municipais têm todos os ingredientes para descansar, apreciar a tranquilidade ou refrescar o corpo. Para desfrutar da boa mesa, com boa-disposição à mistura, fomos ao restaurante A Ribeira “Ementa Cantada”. Aqui, a gastronomia regional está muito bem representada, a comida é excelente, o atendimento “cinco estrelas” e a ementa é literalmente cantada! Quem viaja pela Estrada Nacional 2 não pode perder esta experiência inesquecível, em todos – e para todos – os sentidos. Até porque o restaurante é de fácil acesso, mesmo para os veículos de grande dimensão.
Se decidir ficar por Montemor-o-Novo mais uns dias, o Burriscas Campismo Rural é o poiso ideal para quem gosta do sossego do campo, mas não quer perder a cidade de vista. Com o castelo como horizonte e a ecopista mesmo ao lado, os bungalows estão equipados com cama, casa de banho, kitchenette, ar condicionado e televisão. E os mais pequenos têm um jardim com parque infantil. Nós visitámos e recomendamos.
Num salto, estamos em Alcáçovas, uma linda freguesia de branco casario e com faixas coloridas. Pertencente ao concelho de Viana do Alentejo, tem muita história para contar.
Por aqui passaram romanos e árabes, mas só quando D. Dinis mandou reconstruir um dos castelos para sua morada lhe foi dada a merecida importância. Do seu orgulhoso património, destaca-se o Paço dos Henriques, onde foi assinado o famoso Tratado de Alcáçovas. Inseridos no conjunto arquitetónico do Paço dos Henriques, não quisemos perder a oportunidade de visitar a Capela e o Jardim das Conchas, prova “provada” da diversidade cultural do Alentejo. Reedificada no século XVII, foi criada com cerca de 26 espécies de conchas, em sintonia com a azulejaria e os elementos vítreos, e um circuito de água. A forte imagem marítima não escapa a nenhum visitante.
De seguida, demoramo-nos na altiva Igreja Matriz do Salvador de Alcáçovas, que é o primeiro edifício do estilo templo-salão, e um excelente exemplar da harmoniosa convivência entre o estilo renascentista e o barroco.
Com a pressa diluída no vagar alentejano, dirigimo-nos ao Museu dos Chocalhos, onde está retratado um dos principais produtos feitos na freguesia desde tempos remotos – considerado pela UNESCO como Património Cultural Imaterial com Necessidade de Salvaguarda Urgente. Nesta terra de conventos e palácios reais, onde a divinal doçaria conventual cumpre a secular tradição, rendemo-nos a várias especialidades, entre as quais os amores de Viana e o bolo real de Alcáçovas. Se de gula porventura se trata, pecado seria não os provar.
Na serra com o mesmo nome, rodeada de belas paisagens, chegámos a Vianado Alentejo (quilómetro 550). Ponto de encontro de antigos caminhos romanos, as suas origens parecem remontar ao século XIII, quando era denominada "Viana a par d'Alvito". Hoje, é um convite aberto à descoberta do seu património material e imaterial.
Em pleno centro histórico, vemos o peculiar castelo, a partir do qual irradiam as várias ruas da vila. De estilo gótico, com alguns ornamentos em estilo manuelino, este conjunto arquitetónico com uma estrutura amuralhada e um conjunto de espaços religiosos no seu interior foi mandado construir por D. Dinis em 1313. Hoje está classificado como Monumento Nacional.
No interior do castelo, vimos a Igreja Matriz, com a sua porta magnificamente esculpida, e a Igreja da Misericórdia, com o seu espetacular portal manuelino e os padrões de frescos e azulejos multicolores. Refrescamos a vista com pitorescas fontes e chafarizes. Ao longo de séculos, as fontes naturais ajudaram a transformar secas planícies em hortas, fixando os habitantes.
Já fora da vila, o Santuário de Nossa Senhora d’Aires é digno de se ver. De traça barroca com elementos rococó, este templo mariano de grande beleza continua a atrair peregrinos desde 1743.
Célebre é o artesanato e a produção local, como a olaria ou o mármore verde, que se junta ao cante alentejano para, como é da tradição, se fazer a festa. Boa-disposição e boa gente tem esta terra em abundância. Deixe-se contagiar, visitando a centenária Feira D’Aires (setembro) ou a Romaria a Cavalo (abril). Estas datas já estão reservadas na agenda, o Passaporte da Nacional 2 tem mais um carimbo e está na altura de prosseguir em direção ao próximo destino.
A Estrada Nacional 2 atravessa a vila do Torrão, do quilómetro 565 ao quilómetro 566. Situado na margem do rio Xarrama e numa região abençoada pela natureza, Torrão oferece uma bela experiência pelo melhor que o interior do Alentejo tem para oferecer.
Torrão – cujo nome tem origem na palavra torrejam, que significa “torre grande” – terá sido um povoado com raízes nos tempos pré-históricos, como é visível na Anta do Torrão ou no Monte da Tumba do período Calcolítico. Para além da passagem dos romanos, também foi habitado por árabes até 1217, data em que foi doado à Ordem de Santiago após a reconquista. Ao passear por esta bonita freguesia, com a calma que se impõe, contemplamos o alvo casario coroado por grandes chaminés. Inserida neste conjunto harmonioso, surge a Igreja de Nossa Senhora da Assunção (Igreja Matriz) e despontam fontes, como a Fonte Santa ou a Fonte da Partina.
Seguindo até à ponte romana sobre o rio Xarrama, tivemos o merecido descanso no parque de merendas, junto à capela de São João Nepomuceno. Um pouco mais afastada, mas de visita obrigatória, é a Ermida de Nossa Senhora do Bom Sucesso, cujas origens remontam ao reinado de D. João V e que demorou dois séculos a ser construída.
A Nacional 2 não pára de nos surpreender. Descobrir cada um dos 28 municípios por onde já passámos, foi como visitar “velhos amigos” que nos recebem sempre de braços abertos. No próximo episódio, a estrada leva-nos a Ferreira do Alentejo, Aljustrel, astro Verde e Almodôvar. Esperamos por si.